Pensamentos sobre representatividade em Arrow (de quem assistiu só até o episódio 6 da segunda temporada). É um texto sobre representatividade no geral (então serve pra todo mundo que não assistiu a série), mas tem spoilers, então se você pretende ver…
Preciso comentar que acho interessante essas séries/filmes/livros tentando melhorar a representatividade. Dá até pena, porque eles querem muito mudar isso, mas eles não conseguem, porque o problema de representatividade tá impregnado na forma de pensar dos autores.
Tipo Arrow, eles parecem querer MUITO mudar isso e melhorar, mas aí é “ah, o problema é que a mulher parece só uma secretária do herói? Não é a nossa intenção, vamos mudar!!!!” *coloca a personagem dizendo que não é, mas continua agindo como secretária*
Toda a representatividade de mulher na série é estragada com essas coisas.
Sara -> passa pelas mesmas merdas que o Oliver, mas é mulher: vira defensora das mulheres e assassina dos estupradores.
Mostra ela muito mais indefesa que o Oliver quando chegou na ilha (Queria pegar partes dos primeiros episódios pra poder comparar, eu sei que ele era bobinho, mas acho que não daquele jeito)
Toda a força das Lance vem do pai, que de quebra é superprotetor no melhor estilo “homem defensor das mulheres”.
Pra que aquela garota que ta na ilha tem que ter uma relação amorosa com o Oliver?
E o Oliver explicando pra Felicity por que ele transou com a sócia? Só faltava dizer: “tem mulher que é pra pegar, e tem mulher que é pra casar. Você é pra casar” “por isso eu só faço sexo com as outras” haahahahaa
E ele largando ela pra ir beber com o Diggle? Wtf. Pelo menos mostraram ela não fica feliz com isso, mas é o que a série faz: “nao to feliz” *faz o que não quer* *vira secretária*
E a Sara é mostrada como a “preferida” no troço de assassinos e só ela de mulher. É a síndrome viúva negra: a garota especial diferente das outras que fica no meio dos garotos, mas ainda é diferenciada e destacada por ser garota.
Aquela Sin(?) amiga da Sara que leva um tiro dava uma boa personagem genderqueer.
Toda força de mulher na série vem de homem.
Toda mulher vira vítima e/ou é protegida por um homem em algum ponto. Ou é namorada.
E elas não passam do filtro feminino.
Maaas a série também dá papeis de destaque. A Sara é foda na luta e ela trabalhando com o Oliver foi lindo. Elas são diferentes entre si e todas sabem reagir. Até a Laurel. Elas podem não ter o treinamento da Sara, mas fazem algo. E essa temporada elas já repetiram umas mil vezes reafirmando que elas são donas da própria escolha. Lidam com machismo. Etc. Então tem suas vantagens.
E isso é tipo um vírus na cultura pop. Acho que é o mesmo problema de Jurassic World que eu destaco na análise. Eles super querem fazer uma representatividade boa, mas não conseguem olhar além.
Por um lado é bom, porque eles mudam. Por outro às vezes chega a ser até mais nocivo, porque eles apresentam a “mulher que é dona de si”, só que aí mesmo essa mulher acaba limitada a estereótipos e recursos narrativos problemáticos.
“Toda força de mulher na série vem de homem. Toda mulher vira vítima e/ou é protegida por um homem em algum ponto. Ou é namorada”.
Discordo. Sara e Laurel recebem de fato, bastante apoio do pai, mas não no sentido de que suas personalidades são uma sobra da força de Lance; Sara tem um crescimento, a meu ver, espetacular: da menina que começa a história em um lugar péssimo (‘a que rouba o namorado da irmã”) e que poderia ser esculachada, que chega ao cargueiro querendo cobrir-se com o robe para se tornar uma mulher com uma mistura intensa de luz e trevas, aprendendo a assumir os erros, mas apenas aqueles que, de fato são seus e não a carga do mundo. Laurel teve um crescimento menor, mas, ainda assim mostra força enquanto excelente advogada, fiel à seu valores e ainda traz a temática do alcoolismo pra ser tratada de forma interessante. Acho bacana exatamente como Oliver, enquanto herói, diversas vezes questiona essas mulheres e impede que elas caiam no papel de vítima das circunstâncias. Ele sai de um luga r de macho alfa que quer defender as mulheres sempre, e desenvolve a capacidade de vê-las, cada vez mais, como parceiras. Aí chegamos em Felicity, a melhor personagem feminina, na minha opinião, aquela que nunca, jamais, em tempo algum, foi a donzela esperando ser salva. Aquele que cuida da segurança do grupo, em diversos níveis e encara o herói de frente, colocando de modo bem franco sua opinião e exigindo o debate. A cena citada em que Oliver fala pq dormiu com Isabel, penso de modo diferente: é uma frase infeliz? Sim, mas que, dentro da trajetória e delineamento do personagem faz todo o sentido, tanto enquanto resquício e crítica ao playboy de outrora quanto em relação aos sentimentos por Felicity que ainda estavam bastante nebulosos ali. Enfim, me alonguei horrores, mas eu ADORO falar sobre Arrow e achei esse tema muito, muito, muito bom! Um bj e até mais.
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sobre a parte da força, eu me expressei mal. 😦 Isso é parte de algo que eu percebi há um tempo, que muitas personagens mulheres que são “diferentes” e “fortes” foram treinadas por um homem. Então a força física/capacidade de reagir dela foi aprendida através de um homem. E isso não teria problema nenhum, se praticamente toda história não mostrasse exatamente isso. ESSA É A GAROTA DIFERENTE QUE DESAFIA ESTEREÓTIPOS E NÃO É A MENINA INDEFESA e… ela aprendeu isso com um homem. E a Laurel tem muito isso de “meu pai, símbolo, me ensinou a me proteger”, já a Sara foi ensinada por um clã de assassinos liderado por um homem, a Shado(?) pelo próprio pai.
Em termos de personagem/personalidade, elas são pessoas independentes mesmo e passam por desenvolvimento próprio. Tirando aquele drama em cima do Tommy que não me convenceu, o desenvolvimento da Laurel nessa S2 tá maravilhoso.
Sobre a Felicity, também acho personagem preferida e ela sempre reage. Porém. É o que eu digo aqui: aparece ela falando “A VIDA É MINHA, NÃO SOU SECRETÁRIA”, mas começa a ação e as coisas mudam. Ela nunca se colocou no papel de vítima indefesa, mas já foi retratada e esteve em posição de vítima indefesa inúmeras vezes. Quase sempre, pra falar a verdade. E com direito a ser carregada no colo no melhor estilo “meu herói”. Então eles têm essas personagens que dizem e se recusam a ser vítima, mas a ação começa *é sequestrada* *precisa ser salva* *Tá em apuros* *não pode lutar* *é motivação pra manpain* *vira objeto dramático para o herói salvador*
Sobre a frase da Isabel: faz sentido pra o personagem. Assim como em Game of Thrones faz sentido o Ramsay estuprar mulheres ou o Joffrey torturar mulheres, mas isso não desvalida que eles reproduzem com a Felicity esse tipo de pensamento.
Eu tava no episódio 5 ou 6 da s2 quando escrevi isso, agora to no 13. Algumas coisas mudaram nesse tempo. Tipo ser revelado que tem outra assassina que é a namorada da Sara (ainda assim, a força dela vem do pai… e ela ainda cai na síndrome viúva negra… e nem vou falar de representatividade LGBT+), mas é legal mostrar que há diversas mulheres lutando poderosas.
“Escrevam programas de televisão onde a força das mulheres não sejam descrita como excepcional, mas como normal.” Chimamanda Adichie. Essa é a síndrome da víuva negra e um pouco o que essas personagens caem. uma é A FILHA. a outra é A ADORADA, mas a situação da sara fica melhor mesmo.
E ainda tem aquela cena ótima dela fazendo aquele exercício de pular de barra em barra igual ao Oliver.
É o que eu disse no texto também, eles querem e estão se esforçando pra mudar, mas ainda estão muito presos a uma mentalidade (e acho que eles não escrevem tãão bem assim ;x tipo isso da Sara se suicidando e “não aguento mais mortes” wtf. o início da série ela tava matando gente de boa e essa era a diferença em relação ao arrow. se eles querem que eu acredite na transformação do personagem, tem que me mostrar em vez de apenas dizer que é X e querer que eu acredite.) (e eles sabem mostrar, mas eles ficam nesse vai e vem)
Continue se alongando horrores. Obrigada por vir dividir aqui a sua opinião. Minha análise de Arrow não foi mesmo a mais detalhada e atenta, e eu ainda nem terminei a s2, então fico feliz de ter alguém me ajudando a ver partes que eu não vi. 🙂
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