Ok, eu não queria publicar isso agora enquanto o filme ainda tá no cinema, mas também fiquei imaginando que poderia ter mulher perdida por aí guardando na garganta algumas impressões e não comentando nada, e se tem uma coisa que esse filme da Mulher Maravilha mostra é que: DIANA NÃO DEIXA AS COISAS PASSAREM. Então decidi fazer esse texto secreto aqui pra pelo menos ter em algum lugar esse tipo de conteúdo.
Pra começar, isso é importante:
Em minoria a gente é tão fodido, tem tanto pouco, que quando aparece um a gente espera que seja tudo, a nossa salvação, e aí surge também o medo de que essa pressão irrealista acabe destruindo o que tem.
O segundo é esse trecho aqui, de um thread hoje sobre paineis sobre diversidade só com gente branca:
“pessoas de diversas etnias precisam ser perfeitas, enquanto as brancas só tem que ser ‘não tão ruins'”
E também esse texto da Variety: “Um trend problemático nos cancelamentos: As séries inclusivas estão em perigo?”, onde eu destaco esse trecho aqui:
Beyond that, for some time, many of us have been worried that, if Peak TV were ever to begin contracting, that the shows created by non-white, female and LGBTQ creators — especially the newer entrants into the mix — would be the first ones shown the door.
resumo: Quando tá indo tudo bem e estão fazendo 329823 séries, eles jogam umas migalhinhas e fazem algumas séries com vozes diversas, mas tem um medo de que se começarem a reduzir, as séries criadas por minorias vão ser as primeiras canceladas.
São textos aleatórios, mas que juntos indicam um contexto: qualquer coisa que envolve minoria recebe uma pressão MUITO MAIOR, enquanto gente privilegiada é celebrado por fazer o mínimo. Isso fica pior porque se o filme (série, HQ, qualquer merda) der errado, corre o risco de não fazerem mais.
Por exemplo: fazem filme ruim de Homem-Aranha, de Super-Homem, de qualquer merda que envolve super-herói homem, mas ninguém fala “hm, homem não vende, para de fazer”. Não, eles vão lá e fazem outro. Mas se um de mulher vai mal, eles logo dizem “ih, filme com mulheres protagonizando não vende, não vamos fazer mais.”
E apesar disso ser uma preocupação, o histórico indica que de fato eles fazem isso. Esse ano mesmo um executivo da Marvel tava falando que “diversidade tá matando os quadrinhos”, enquanto os dados provam o contrário.
Então quando a gente discute o filme da Mulher Maravilha, é uma questão delicada porque a gente quer muito que vá bem, porque é a primeira vez nos meus 25 anos que eu vou ao cinema pra ver uma mulher protagonizando o filme de super-herói DELA (enquanto já assisti mais de 30 sobre homens), porque eu quero muito poder ver mais filmes assim, filmes diferentes, filmes com mulheres protagonistas interessantes vivendo aventuras e enfrentando vilões e tendo poderes interessantes e história fascinante e blablabla. O ponto é que a gente vive na merda de um mundo machista, que acha normal a ideia de que uma mulher não é capaz de protagonizar uma história assim. A gente passou anos vendo filme de Thor, Homem-Formiga, Homem de Ferro, Doutor Estranho, Homem-Aranha, Hulk, Batman, Super-Homem, Capitão América, Deadpool, Vingadores – sem nenhum filme com mulher. Então um filme como Mulher Maravilha é uma oportunidade, rara, de tentar mudar esse cenário. Provar que é possível pra uma indústria machista.
Olha a pressão.
Felizmente, parece que eles conseguiram fazer algo capaz de aguentar a pressão. Eu não sei, vamos ter uma ideia no final desse primeiro fim de semana de estreia, quando vamos ver o resultado disso em dinheiro. Mas eu gostei do filme. Eu não sei o que eu esperava, mas foi muito melhor do que eu esperava. Tem cenas poderosas. É uma história sobre ela. Me faz gostar da Diana. Teve todo o tratamento de herói. Eu lembro que quando era pequena assistia Hércules e adorava a parte da transformação dele de jovem desajeitado em um herói poderoso, e eu pude ver isso acontecer com a Mulher Maravilha. (aliás, segundo filme esse ano que eu vejo mulher tendo narrativa de herói, o primeiro é Moana) Então foi muito bom.
Eu tava com medo de chegar lá e ver uma merda qualquer, mas fizeram um filme que vale a pena.
Agora, com tudo isso em mente, eu quero comentar sobre uns detalhes envolvendo a representatividade da mulher e o tratamento de certas coisas, que indicam os desafios que nós temos agora.
NÃO ACREDITO QUE FIZERAM UM FILME DA MULHER MARAVILHA CENTRADO EM ENTENDER HOMEM
Isso é algo que no geral, é uma das coisas que mais me irritou. Homem é igual papel higiênico grudado no pé, tu sai do banheiro e o troço fica ali te seguindo. Pode parecer demais, mas quero que você me diga qual dos 30 filmes de super-heróis foi sobre homem entendendo mulher. Nenhum, exato. Aí você faz o de mulher e… é sobre homem.
Eu sei que o mito da Mulher Maravilha envolve a questão desse grupo de mulheres amazonas que vivem em uma ilha só de mulheres justamente como uma rejeição ao mundo dos homens (FAZER UM FILME PRA EXPLICAR POR QUE ISSO ACONTECEU? NAAAH VAMOS FAZER UM PRA ENTENDER COMO ISSO NÃO É BOM!!), aí Tem a Diana que é uma diplomata e vem pra o nosso mundo nos proteger e compartilhar essa sabedoria. Então, tipo, no próprio mito da Mulher Maravilha existe essa questão de rejeitar homens e decidir se isolar vs. decidir lutar pela humanidade.
Porém. O filme é todo voltado pra tratar humanidade como “mankind” (Homem) e o próprio filme é consciente disso quando a Mulher Maravilha fala “I’m the man” (algo assim), só que além de uma brincadeira superficial com as palavras, o filme de fato trata a humanidade como homens. A maioria esmagadora dos personagens é homem. O Steve (homem) e aqueles 3 caras (todos homens) estão ali como representantes da humanidade. O cara que ela pensa que é o Ares – é homem. O próprio Ares é homem (E NÃO ME DIZ QUE ELE PRECISA SER HOMEM. ELE É UM DEUS CARALHO ELE PODE TER A FORMA QUE ELE QUISER E NO PRÓPRIO FILME ELE MUDA DE FORMA). Fora da ilha, só tem duas mulheres secundárias. Duas. Então, sim, eles tratam “humanidade” como “homem”. Eles criaram essa progressão da entrada da Diana “no mundo dos homens“.
Do jeito que eles fazem, não é nem como se a Diana fosse uma mulher – ela é uma deusa, de forma feminina, que surge para proteger a humanidade (= homens).
Só não é pior, porque na batalha final o Ares coloca a Dra. Veneno lá desafiando a Diana a matá-la. Mas é o único momento no filme inteiro que o conceito de humanidade inclui mulheres.
Sério, custava um ou dois daqueles ajudantes do Steve ser mulher? A desculpa de que “não tinha mulher na guerra” não é nem cabível aqui. Primeiro, porque se sabe que tinha. Segundo, PORQUE ELES NÃO SÃO SOLDADOS OFICIAIS. ELES SÃO TODOS MEIO QUE GENTE QUE FAZ COISA ILEGAL POR FORA. Era o cenário ideal pra ter uma mulher ali.
Imagina: uma mulher que quis lutar na guerra, mas não foi aceita e pega essa missão como oportunidade pra fazer algo. No final, imagina que paralelo lindo uma mulher sem poderes arriscando a própria vida pra tentar acabar com os venenos, enquanto Diana tá ali comendo mosca ao perceber que os seres humanos são crueis sozinhos. Ia ajudar demais na narrativa dela concluir que apesar de todas as merdas, eles continuam tentando.
Ou diferente, podia até colocar a mulher como “querendo se vingar e matar”, pra reforçar o tema de que o grupo “deles” também tá sendo controlado por Ares – ou seja, todo ser humano (HUMANIDADE, não homem) sofre com ter a escuridão dentro de si. Outra possibilidade é aquele cara que é atirador, podia ser uma mulher que tinha servido no exército se disfarçando pra parecer homem, o que reforçaria o tema de que esse é um contexto machista onde mulheres, mesmo sendo tão capazes quanto, precisam se esconder. Não precisa ser nada grandioso, só colocando uma mulher ali já faria diferença.
Por que ninguém pensou nisso? Por que TRÊS homens?
(porque no fundo, como acontece por toda ficção, quando pensam em humanidade não pensam em mulher)
Então o que a gente tinha é que, no próprio filme da Mulher Maravilha, o princípio smurfette tava firme e forte. Não era diferente da Gamora sozinha em Guardiões, da Viúva nos Vingadores, da Jyn em Rogue One. Quer dizer, a única diferença é que ela é a protagonista, pelo menos. Mas você vê que essa mentalidade smurfette se carrega até aqui.
Enfim, uma mulher ali teria desconstruído a ideia de que “humanidade” é sinônimo de homem. Aliás, quero constar que as únicas duas outras mulheres – a Dra. Veneno e a Secretária – perdem parte da própria autonomia quando o Ares revela seu plano. A Dra. Veneno não era genial, Ares que deu as ideias, ela era só alguém cruel o bastante pra construir. A outra secretária recebe um cargo de “comando” temporário, mas foi dado pelo Ares. Ou seja. São só umas marionetes ali.
Sinceramente, parece que esqueceram que existe mulher no nosso mundo. E a única razão das amazonas serem só mulheres é porque é a mitologia, se não enfiavam um monte de homem também.
Aliás, vamos falar delas. A primeira a mudança recente enfiando zeus na história. Mulher Maravilha foi criada lá no barro pela mãe e recebeu vida com ajuda de Hera ou das deusas. Mas recentemente nos quadrinhos (que foi pra o filme) enfiaram Zeus na história. É tipo aquela cena do filme que a Diana fala que leu os livros de Clio que falavam que mulher não precisa de homem pra ter prazer e o Steve parece não acreditar. Eles não aceitam que as mulheres podiam ter criado ela sozinha. Parece uma coisa pouca, mas:
O conceito de uma mulher criada no barro que ganhou vida com ajuda das deusas, nessa ilha só de mulheres, e enviada para o nosso mundo (dos seres humanos, não dos homens) é meio que genial. É como se todos os anos na ilha tivessem dado a oportunidade de criar uma mulher que vive por si só, independente, é o fruto do conhecimento de uma sociedade só de mulher e, de certo modo, o “presente” pra o nosso mundo. A Mulher Maravilha não só traz conhecimento e sabedoria, ela é meio que esse conhecimento e sabedoria incorporado. Um mundo em que as mulheres puderam criar por elas mesmas uma mulher. Ela é a primeira que nasce a partir disso!!!
Aí vai lá e enfia um homem e fode com toda a simbologia foda-se.
Pior ainda, é que o filme (não sei os quadrinhos), ainda mostram como se as amazonas tivessem sido criadas como… um presente pra os homens?? Basicamente babás. A própria história é meia estranha que eu assisti assim:
?????????
“As amazonas foram criadas pra lidar com a raiva e invenja e as merdas dos homens que faziam guerra, aí depois de anos de paz, a rainha liderou uma revolta contra a escravidão”
??????????????????????????????????????????????????????????????????????????????????????????
COMO É QUE TEVE ANOS DE PAZ SE TAVA TENDO ESCRAVIDÃO?
(gretchen puta)
Devo ter entendido isso errado, porque não é possível.
Mas o ponto é que já começa fodendo com as amazonas porque de repente elas já elas foram criadas POR HOMEM (zeus) pra servir à humanidade (como já disse, que o filme estabelece sendo sinônimo de homem).
Então tipo toda mulher ali foi criada por homem pra servir a homem e aí a Diana foi criada também por homem pra servir a homem.
E já que estamos falando das Amazonas, NADA DAQUILO FAZ SENTIDO. É bonito, lindo, amei ver. Mas NÃO FAZ SENTIDO. Elas estão naquela ilha… esperando o momento de Ares retornar? Se a Diana foi criada pra isso, PRA QUE A RAINHA NÃO QUER QUE ELA VÁ? NÃO QUER QUE ELA TREINE? TU É BURRA, MULHER? NÃO É, NÃO DEVERIA SER. E CADÊ O CONHECIMENTO CIENTÍFICO? POR QUE É QUE QUANDO OS CARAS CHEGAM NOS BARQUINHOS COM UMAS ARMINHAS SAEM MATANDO FÁCIL GUERREIRA TREINADA COM UM TIRINHO? Desculpa, se for assim quero Batman morto na minha mesa agora que ele é humano e não passou séculos numa ilha encantada treinando todos os dias. Porra, vai tomar no cu.
Pareceu aquela visão colonialista de europeu encontrando os indíos que chegam com flechinha contra arma (o que é usado pra justificar colonização e genocídio). CADÊ MINHA NAVE INVISÍVEL NESSE CARALHO? COMO É QUE ELAS NÃO DESENVOLVERAM UMAS ARMADURAS FUDEROSAS? COMO É QUE ELAS SABEM 2398723 LÍNGUAS MODERNAS, APRENDEM, MAS NÃO SABE QUE ARMA FOI INVENTADA?
Aí várias outras perguntas também. SE ELAS FORAM CRIADAS PRA RESOLVER O PROBLEMA, POR QUE ELAS FICAM LÁ E DEIXAM A MERDA ACONTECER? VAI ME DIZER QUE NÃO TEM UMA QUE VAI QUERER IR TAMBÉM? E EU ENTENDO QUE ELAS TENHAM CHEGADO A CONCLUSÃO DE QUE SERES HUMANOS SÃO UMA MERDA E QUEREM FICAR LONGE, INCLUSIVE ME IDENTIFICO, MAS PRA QUE ELAS ESTAVAM CRIANDO A DIANA ENTÃO? PRA QUE A MÃE COLOCA O PESO DA DECISÃO NAS COSTAS DELA? CADÊ A CONCLUSÃO DA STORYLINE DAS AMAZONAS NO FIM DO FILME?
E CADÊ ZEUS NESSE CARALHO?
Eu posso ficar fazendo pergunta inútil aqui pra sempre, mas acho que a resposta é: eles só incluíram as amazonas com parte da mitologia da Diana, tentaram fazer um resuminho rápido da história de origem dela que o homem vem, tem a disputa pra mandar de volta, que a Diana entra sem a mãe querer, blablabla, só que mudando a estrutura perdeu a motivação e, pra completar óbvio, existe o machismo ali que impediu de colocar elas com uma tecnologia poderosa/avançada e sabedoria que carrega a Diana.
Não, porque sério, qual é o peso das amazonas na Diana como personagem guerreira no filme? Nenhum. “Ah, a luta, o treinamento..” ok, mas também não, porque ela poderia ter treinado em qualquer outro lugar, já que as guerreiras sozinha com próprio treinamento morrem a rodo. O que torna ela diferente, novamente, não é por ser criada por mulher ou ter treinamento especial, é por ter superpoderes.
E assim como a questão de humanidade como sinônimo de homem, esse é um problema que podia ter sido resolvido fácil. Primeiro, a Antiope sei lá não precisava morrer (trope de mulher morrendo no início de filme, clássico. outro que também aparece em Guardiões da Galáxia e Rogue One. Hoje em dia acho que se filme não começar com mulher morrendo não é filme), as Amazonas poderiam ter sido mais resistentes às armas. Até morrer, mas bota elas levando 50 tiros e ficando, bota ali uma tecnologia mais avançada. Mas principalmente, naquela conversinha final da mãe com a Diana, em vez de drama desnecessário que é 0 desenvolvido de “você é minha maior tristeza”, colocava a mãe falando alguma coisa de sabedoria, “lembra que ser uma amazona é (sei lá)”, ou “eu queria ter protegido você sempre, mas um dia você vai entender X coisa” – e aí no fim do filme BOOM, DIANA LEMBRA DA MÃE E MATA O ARES. KBÔ.
Aliás, o Ares e as amazonas são colocados no mesmo nível, né? Os dois não acreditam na humanidade (aka. homens). Só ele tenta destruir e elas fogem. Me recuso. Mulher é muito mais inteligente que isso, ainda mais mulher vivendo há séculos longe de homem enchendo o saco.
Então no fim ela vence não porque é uma guerreira amazona poderosa, mas porque é filha de zeus.
(inclusive, tem um paralelo da rainha falando com a Antiope usando “sister” [#nohomo?], enquanto quando a diana fala com o ares é “brother”)
Às vezes eu acho que se eles pudessem varrer a ilha de mulheres da história da Diana, eles varriam. APAGA, ELA AGORA CRESCEU NO OLIMPO.
Ao mesmo tempo, eu também às vezes acho que isso é o reflexo de uma visão machista que trata a mulher como algo idealizado. É o tipo, quando os caras querem dizer que a mulher é importante, então ela praticamente vira um tesouro e é endeusada. A intenção é boa, mas ainda é tóxico pras mulheres. É como se mulher fosse criatura mitológica vindo de outro lugar – ela não faz parte do “mundo dos homens”.
Aliás, isso não é nem só teoria, tu vai encontrar um monte de texto por aí mostrando como mulher é considerado um “tipo”. Por que só tem uma mulher nos grupos? Porque mulher é um “tipo” de homem. Tem o herói, o fortão burro, aquele fdp que não quer ser herói mas é mesmo assim, tem o mais fofinho, tem a mulher.
E no fim, tem esse relacionamento romântico e o foco no Steve como o cara que se sacrifica – ele é o exemplo da humanidade pra ela. Que sementa a ideia de que ela tá fazendo tudo por causa de homem. Dois exemplos dados que resolveriam isso: um seria se na hora H do desespero, antes da explosão dela pra matar o Ares, fosse porque ela vê algo tipo a cidade destruída. Outro seria se a motivação tivesse associada a um ensinamento/algo das Amazonas, ou as Amazonas ressurgindo pra lutar com ela. Ou até: SÓ O AVIÃO EXPLODINDO. SEM O STEVE FALANDO NADA PRA ELA.
O CARA PASSA O FILME INTEIRO TRATANDO ELA IGUAL CRIANÇA E EXPLICANDO TUDO E NO FIM DA A LIÇÃO DE MORAL SOBRE A HUMANIDADE, EM VEZ DE DEIXAR A DIANA CONCLUIR SOZINHA.
Ou seja, no fim das contas, fica uma coisa de mesmo fazendo merda, vale perdoar o homem.
E seria até ok porque isso é válido, se não fosse o histórico de filmes romantizando homem branco fazendo merda. Inclusive, esse é um problema que tá quase acabando com a história da Supergirl, onde tem um cara que literalmente fez todo tipo de merda (tipo escravidão e falta de respeito dentro do relacionamento, beirando a abusivo se não abusivo), mas ainda é contado como uma história de “ele só tá aprendendo, ele tem boa intenção, ele te ama, tem que entender o lado dele”. Mulher Maravilha não chega nem de longe a sofrer como Supergirl tá sofrendo, mas ainda é alarmante ver a mesma mentalidade por trás de tudo.
Ou seja, mulher não pode nem ter o próprio filme, que precisa viver em torno de homem e assegurar os egos dos homens aqui fora – e encontram forma de fazer isso numa história que é literalmente sobre mulheres que decidiram viver independente de homem.
E a merda é que centrar história em homem, mesmo com mulher protagonista, é algo tão enraizado que a maioria das pessoas nem percebem o que estão fazendo. Você vê que com ajustes mínimos, mudava o equilíbrio, mas Hollywood continua fugindo desses ajustes e isso é algo a ser considerado quando se trata de filmes de super-heroínas/mulheres em ação no futuro.
Além disso, o filme tem outras coisas tipo o trope Born Sexy Yesterday, que é literalmente um trope machista. E ela não é sexualizada, PORÉM, o tempo inteiro é objetificada. “Você é muito linda, coloca um óculos”.
Aliás, eles vão direto pra ideia da mulher donzela sexualmente inexperiente. Quando eles conversam no barco e ela fala que leu nos livros – cara, a Diana tem quantos anos? Era um momento pra fazer um comentário sobre masturbação, que fosse. “Ah, mas é um filme de família” – tanto Guardiões da Galáxia quanto Power Rangers fizeram. E é claro, não dá pra ignorar que ela pode ter tido experiência com outras mulheres, já que a Mulher Maravilha é bissexual no canon. Mas homofobia não vai deixar eles falarem. Mas ok, eu não tô dizendo que quero a Mulher Maravilha ou uma cena sexual no filme, mas eles colocaram – duas. Uma do Steve pelado e a outra deles no barco, só que nas duas ela aparece como a inexperiente e inocente e ele como o conhecedor.
Essa segunda do barco me irrita mais ainda, porque da maneira que é montada – ela desinformada sobre a cultura deles envolvendo casamento, aquele momento de “ih jesus eu dividindo a cama com ela” e o Steve é sempre “ok, ela não entende das coisas.” Quando ela fala dos livros, e ele sacaneia ela ter lido os livros, é usado pra comédia (hahaha imagina se é verdade) e ainda fica o tom de “ela não entende realmente”.
Então eles tiram a sexualidade, fazendo aparecer só em relação ao homem e ele como quem vai ensinar.
E não preciso falar que esse puritanismo de mulher recatada é uma das coisas que aprisiona a mulher e tira o controle dela sobre a própria sexualidade.
Outra coisa é aquela garota correndo atrás da Antiope quando ela tá morrendo – SERIA ISSO UM SUBTEXTO DE NAMORADA? Não sei nem o que é pior, o fato deles apagarem as amazonas terem namoradas, ou o fato de que já começa fazendo um Bury Your Gays numa personagem que não dava pra ser gay abertamente por causa de homofobia. “Você não pode nem existir, MAS se fosse existir, ia morrer”
E também o tratamento das mulheres negras. Tem bastante delas no meio das amazonas, mas elas são secundárias (POR QUE A ANTIOPE NÃO PODIA SER NEGRA?), ainda achei estranho pra porra as 2 das 3 mulheres negras que aparecem mais em cena ser: 1) uma parece uma babá. e 2) a outra é a “fortona”, colocada como a mais forte entre todas, porque tem o estereótipo racista de que tratam mulher negra como mais bruta mais resistente vs. mulher branca delicada (inclusive, essa ideia deu suporte a escravização e às mulher negra fazer o trabalho duplo de “femininos” tipo cuidar da casa e trabalho pesado em plantação). Então é meio sinistro que as poucas mulheres negras que você tenha colocado num filme sejam assim.
Eu já falei tanto que não sei se tô esquecendo de algo, mas por enquanto é isso. Lembrete de que aqui eu tô só comentando onde a gente vê o limite nessa história de “diversidade”, porque teve coisas boas no filme e, como eu falei lá no início, eu gostei. Mas ainda dá pra ver que, além de ser um filme focado na mulher (branca hétero) maravilha, as personagens femininas ainda são limitadas a estereótipos machistas criados por homem e tudo é construído baseado em homem. O filme tá precisando seriamente de roteiristas mulheres e, infelizmente, ainda corre o risco de mesmo assim dar merda.
E se você tinha reparado nessas coisas e não sabia muito o que falar, porque a gente não quer criticar o filme agora, espero que isso te ajude a extravasar(?) os sentimentos.
Vamos torcer por um futuro onde as super-heroínas consigam histórias melhores e não centradas em homens. Além disso, essa é uma oportunidade pra gente lembrar da verdadeira história da Mulher Maravilha e celebrar as partes do filme que reforçam isso.
Esse filme é tão bom que parece que foi feito pela marvel
LikeLike
Esse filme é tão bom que parece que foi feito pela marvel
LikeLike