Eu tava reparando que vulnerabilidade é um dos temas centrais da série. Quer dizer, no livro 4 o que a Korra aprende é se abrir e se conectar com o mundo, saindo de um momento onde ela havia se isolado completamente. Mas não é só aí que a história desenvolve isso.
Percebi enquanto eu pensava sobre a Su, filha da Toph. Enquanto Su parece uma artista de espírito livre, mas na verdade tudo o que ela procura é um ambiente superprotegido para criar uma família segura, o que é um reflexo da criação sem regras de Toph. Ela constrói uma cidade (esqueci o nome agora), mas é uma forma de se isolar do mundo e criar um ambiente seguro onde ela tem controle. As grandes proteções de metal que isolam a cidade do perigo é só um problema (e, dificilmente ao acaso, é o que se transforma no monstro da batalha final de The Legend of Korra).
A superproteção vira o monstro.
Aliás, já no livro 3 essa super proteção se torna uma ameaça. Enquanto Su diz que é a cidade mais segura do mundo e que ninguém pode mentir, porque ela tem a companhia daquele cara que consegue saber se você tá mentindo, esse acaba sendo o problema: ele era a única pessoa que poderia mentir com segurança. Eu ainda não interpretei isso bem, mas tem alguma coisa sobre “ser escravo de uma verdade só” ou “seguir uma verdade cegamente” por aí.
Lin é basicamente o contrário. Enquanto Su criou um ambiente fechado onde ela pode ser livre, Lin foi para um ambiente livre onde ela vivia fechada. E ela lida da própria forma com os problemas de crescer em uma família sem raízes onde todo mundo era livre das regras demais. O que é interessante, já que a mãe dela criou a polícia de metalbenders, enquanto a irmã criou uma cidade de metalbenders e a própria Lin seguiu uma carreira para manter a ordem.
Enfim, apenas lados dessa história de viver vulnerável vs. se fechar para o mundo. Lin e Su são duas personagens que pela própria história representam isso, como ao longo da série buscam o equilíbrio nessa dinâmica. Mas elas não são as únicas.
Pra constar: A forma como Toph criou elas é um reflexo dos pais superprotetores que ela teve. Toph e Korra têm muita coisa em comum, e é curioso que ambas na busca por fugir disso e viver a própria vida acabaram presas em uma caixa de metal.
Eu já falei da jornada da Korra no livro 4, que em si tem esse arco de aprender a ser mais vulnerável, mas também é o fechamento do arco maior da série. É interessante que do primeiro episódio pra o último nós temos Korra no mesmo ponto: saindo em uma viagem. No primeiro ela faz escondido forçando o caminho dela, no último ela termina saindo em uma nova jornada, mas uma muito mais… tranquila, se é assim que eu posso dizer. A diferneça é que ela tem uma ideia melhor de pra onde ela tá indo, o que ela tá fazendo e um controle melhor da própria vida. É o caminho de uma busca tranquila, não o grito de desespero por liberdade.
(Dúvidas: Elas pararam pra falar com alguém? deixaram bilhete na geladeira??? Asami ia abandonar a cidade destruída sem nenhuma instrução???)
Mas eu ia falar do primeiro livro, que é onde nós vemos Korra ter o primeiro choque de realidade. O crescimento dela é um reflexo da história do Aang: eles não queriam repetir o mesmo problema de colocar o peso do mundo nas costas de uma criança, então fizeram Korra crescer isolada pra ter certeza de que ela ia ter o melhor preparo possível antes de precisar atuar como Avatar. Isso, em si, causou os próprios problemas. Até a última temporada Korra está lutando para provar que é competente para dar uma opinião. E eu adoro o primeiro (segundo?) episódio do Livro 1 quando ela chega em Republic City e não entende nada. Não sabe que não pode pescar no parque, não sabe diferenciar mendigo, não sabe que precisa lidar com dinheiro e muito menos que seu trabalho não é “lutar contra o mal”.
O primeiro livro é o conflito da Korra para sair dessa concha em que foi criada, aprendendo que o mundo não é o “do bem” vs. “do mal”. Tanto que nós temos os dois irmãos vilões representando dois lados diferentes (quando é que Avatar não usa irmãos pra mostrar pontos opostos? nunca. adoro esse conceito de que mesmo os “inimigos” e “opostos” vieram do mesmo lugar). A primeira vez que eu vi o Livro 1 fiquei com um pé atrás “que história conservadorista, Korra está lutando contra um movimento de libertação”, só que ela não tá exatamente a favor do governo e um dos momentos mais tensos é quando fica presa em uma caixa de metal e/ou tem seu sangue dobrado. O Avatar é uma entidade separada que luta contra ideias absolutas. Equilíbrio.
Epa, divaguei na análise.
Enfim, o primeiro livro também mostra ela aprendendo a lidar com a realidade através do conflito vulnerabilidade vs. superproteção.
Também quero acrescentar que nesse a Korra aprende a dobrar ar através de técnicas de probending, provando pra o Tenzin que coisas novas podem ser integradas a conhecimentos antigos. O que em si é uma espécie de vulnerabilidade (estar aberto a novidades) vs. superproteção (conservar com medo de destruir). É meio que buscar estar aberto ao mundo para poder crescer, mas não ser destruído por ele.
No Livro 2 esse conflito é aprofundado quando tanto Tenzin quanto Korra lidam para entender seu papel no mundo. Eu gosto bastante da história desse livro, porque mostra como é ter esses grandes modelos de sucesso ao seu redor – e ideias sobre quem você tem que ser – e no meio disso descobrir qual é o seu caminho. Se livrar da imagem imposta para descobrir o verdadeiro eu. Quem é Korra sem o Avatar? Quem é o Tenzin sem o Aang? (e a história da Jinora é como aquela criança prodígio que aos 10 anos conquista sucesso absoluto e você ainda nem aprendeu a fazer a própria comida e COMO É POSSÍVEL, EU SOU UM FRACASSO. Mas na verdade é que você está julgando o próprio caminho pelo dela, o que não é certo porque a sua história é única. Então, novamente, aprender a separar…)
Mas, Dana, o que isso tem a ver com vulnerabilidade e superproteção? Bem, eu imagino superproteção com uma força de tensão – você se fecha, você segura, você procura um lugar protegido. E o que é mais protegido do que a vida de alguém que deu certo? É um caminho que existe, que você sabe que vai dar certo (ou não, mas que deu, então: fatos), que é mais seguro, que tem aprovação. Decidir encontrar o próprio caminho é jogar a segurança para o alto e ser vulnerável para o que pode acontecer. Para descobrir quem você realmente é. Para o fato de que essa pessoa pode não ser o que você espera, ou de que pode acontecer merdas. Tipo você ficar de cadeira de rodas.
Extra: a briga de mentores Tenzin vs. Unalaq. Enquanto o Tenzin está “perdido” no próprio papel e parece não saber guiar Korra, Unalaq segue uma tradição anciã que tem funcionado, então depois de ter a segurança abalada na primeira temporada, Korra busca o caminho que parece certo (“aprovado”).
De quebra, a história do primeiro Avatar também segue essa estrutura. Ele vive em um ambiente fechado da cidade-tartaruga (onde ele é excluído e rouba pra poder sobreviver) e arrisca buscar uma vida melhor no mundo dos espíritos. E libera o caos, literalmente.
Se refletir agora, toda história é meio que uma briga entre a vulnerabilidade e a superproteção. Raava e Vaatu amarrados – um puxando eternamente para se soltar, outro puxando eternamente para prende-lo. A Jornada do Herói (estrutura narrativa) é o caminho de uma pessoa que deixa seu ambiente seguro para enfrentar o mundo e encontrar um ambiente seguro (mais saudável). Mas The Legend of Korra vai um pouco além e, como uma história que trata do equilíbrio, desenvolve através de inúmeras narrativas diferentes esse conflito.
Mako e Bolin: garotos que viveram na rua (ambiente vulnerável) e buscavam proteção. Ambos têm características moldadas por essa vida.
Asami: uma garota que vivia em um ambiente superprotegido e lutou da própria forma para “não ser a garota do papai”. Ela meio que conseguiu isso…
Kuvira: bem, a busca dela no Livro 4 é totalmente uma revolta contra a vulnerabilidade. Ela viu o Reino da Terra abandonado e decidiu unir tudo de modo supercontrolador para não ter nenhum ponto fraco. Love is weakness, meus amigos.
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